Contigo nasci
Hoje, vinte de Setembro do ano dois mil e oito, eu estou vivo, no meu pais, na minha cidade. Em que cidade não importa. Amanhã não!
E eu vivo no meio desta maravilha em porcelana e tenho um nome, uma ocupação, um dever e tempestades de desejo, aqui, secretamente, na voz afogada, algemada. E eu respiro, e ando, e caio, e rodo e volto a ver árvores sedentas e pássaros embriagados na música do vento, e estou imóvel e absorto e maravilhado de mais um dia a arder no peito.
Hoje, vinte de Setembro, olhos nos olhos, um planeta onde os lábios se juntam aos lábios, eu vivo uma única vez, um dia inumerável, entre as minhas mãos, a vida flui, sede nas minhas artérias loucas, por mim, através de mim, e trespassa-me neste minuto, hoje, vinte de Setembro, hoje, vinte de Setembro.
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Como a luz entre os dedos deslizam
Como tu própria entre as minhas mãos
Como tuas mãos entre as minhas se entrelaçam
Um dia que começa em minhas palavras
Luz que amadurece até se tornar corpo
Até ser sombra de teu corpo luz de tua sombra
Rede de calor pele de tua luz
Um dia que começa em tua boca
O dia que se perde em nossos olhos
O dia que se abre em nossa noite
Como a trepadeira de mil mãos
Como o incêndio e sua voraz plumagem
Como a primavera assaltando o ano
Os dedos da música
As garras da música
A hera de fogo da música
Cobre os corpos cobre as almas
Corpos tatuados por ardentes sons
Incendiou-se o mundo
Uma rapariga ri à entrada do dia
É uma pluma incendiada...
A música exibe seus braços nus
Suas espáduas nuas seu pensamento nu
No calor afia-se o jubiloso momento
água terra e sol são um único corpo
Música despenhada
E ardemos...
[O.Paz]
Nasci a 20 de Setembro, contigo.
Tudo,
perdura a chama
e queimam ainda meus lábios
as memórias
que não se dissolvem nos dias
Cada gesto novo
recomeça a viagem, a descoberta,
e no amplexo das tuas coxas, perdida
eu reencontro
os sons e os cheiros
num lugar qualquer de mim guardados,
antes de partir
Entre os meus e os teus olhos
estende-se a languidez cúmplice
decifrando sinais
de velhos amantes,
da tua à minha boca
a curta distancia
de um sopro vai
e tudo em nós se mistura...
em tuas mãos, o ritual do fogo se inicia
e cresce a lava do desejo
que nos arrasta
por entre sussurros e explosões
E é num mar de calmaria,
na embriaguez dos ópios naturais,
que nossos corpos
húmidos, quentes, saciados
desaguam.
[A.Santos]
corpos inundados, transbordam.