À distância de um beijo
Por razões serenas passamos algum tempo de porta aberta. Oprimem-se as mãos, é arriscado beijar, nem sequer olhar demasiado...
Na noite fecha-se a porta. Estamos já, tu e eu, em campo aberto, partilhando o toque como algo precioso, oculto nas noites, com jardins sobre os joelhos, apenas tu e eu. A sombra enlaça os nossos corpos, a força de braços, o beijo insaciavel que se bebe a si mesmo e redime distâncias...
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Deitados lado a lado, envoltos nas fadigas do dia.
Paisagem fresca e calma..., o sono repousava sobre nós.
Um peso delicioso, pesando na minha perna, despertou-me. Reconheci o teu pé.
Soube então, por um homem e uma mulher que se conhecem, o que era estar deitado lado a lado.
Compreendo agora o que uma tal fonte tinha de inesgotável, de constante, como uma abundância que nunca enfraquecia. Assim é o amor sobre o qual o tempo não faz mais do que avivá-lo: as suas raízes estendem-se até não deixar nada que não abracem.
[E.Sampaio]
À distância de um toque..., tudo.
Contigo,
Dissolve o mesquinho desejo de existir em face do mundo
Com o olhar pervagante e larga ciência das coisas.
Já não defrontamos o mundo: nele nos diluímos,
E a pura essência em que nos transmutamos dispensa
Alegorias, circunstâncias, referências temporais,
Imaginações oníricas,
O vôo do Pássaro Azul, a aurora boreal,
As chaves de ouro dos sonetos e dos castelos medievos,
Todas as imposturas da razão e da experiência,
Para existir em si e por si,
À revelia de corpos amantes,
Pois já nem somos nós, somos o número perfeito: UM.
[Carlos Drummond de Andrade]
Um perfeito UM.
Sim, somos.