Que o homem é a mais nobre das criaturas, pode inferir-se de nenhuma outra ter contestado tal afirmação.
E tu
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As sombras, o alento, a vida, logo a luz que de repente entra e tu com ela. Os cegos podem com o tacto comprovar o amado, o meu corpo é todo tacto na tua presença.
Ela diz que quer ser esmagada pelo corpo do homem com o dobro do seu peso. Está deitada na cama, na obscuridade, com os olhos muito abertos. De tronco nu, ele está sentado. Pergunta-lhe sem virar a cabeça: Serás capaz de aguentar? Ela diz que gosta mesmo de se esmagada até perder o fôlego. Depois ri...
A cortina move-se, ele afasta-se. A silhueta da mulher perfila-se na janela. Abre-a, cá fora telhados escuros, ao longe, o encadeado das varandas e das mansardas dos antigos edifícios, o céu azul límpido, embora não se saiba dizer se é o cair da noite ou a manhã. A mulher vira-se, o seu corpo e o seu rosto estão difusos, só os olhos brilham intensamente, como os olhos de gato na escuridão.
Um beijo em lábios é que se demora e tremem no abrir-se a dentes línguas tão penetrantes quanto línguas podem. Mais beijo é mais. É boca aberta hiante para de encher-se ao que se mova nela. É dentes se apertando delicados. É língua que na boca se agitando irá de um corpo inteiro descobrir o gosto e sobretudo o que se oculta em sombras e nos recantos em cabelos vive. É beijo tudo o que de lábios seja quanto de lábios se deseja.
Aquele que diga a primeira palavra deixará cair o primeiro vaso, aquele que golpeie o seu assombro com violência verá aparecer o fogo nos seus cabelos, aquele que ria em voz alta será o primeiro a guardar silêncio, aquele que desperte antes de tempo surpreenderá o seu corpo entre as árvores; e o mar, como algo interrompido, volta a ouvir-se ao longe e na sua respiração escutamos outra vez o ruído daquela porta que bate empurrada pelo vento.
A árvore em frente à sua casa cheirava-lhe diferente a cada manhã. Por vezes um aroma como os cabelos da sua mãe. Outras vezes levava o cheiro das flores emprestado; e outras ainda cheirava como de regresso de uma longa caminhada. A árvore em frente à sua casa tinha diferentes cheiros, como as pessoas crescidas.
Se a morte deve terminar em conflito, respondi-lhe eu, essa vida miserável não pode ser vida. Pois quem poderia aguentar a escuridão sem um amanhecer? Essa tua vida é uma morte. Pedes aos santos, cujas faces artificialmente iluminadas te asseguram da sua grace interior; se ao menos eles podessem resolver as tuas questões e satisfazer os teus ansiosos desejos. Um brilho oleoso ilumina a tua fronte, enquanto te ajoelhas dizes: "'Esta vida para me encontrar com o Senhor.” Mas a palavra que ouves foi escrita pelos homens, é a verdade de uma igreja não de uma vida divina ou eterna; é a promessa por cumprir do triunfo da vida sobre a morte, feita a troco de pecados perdoados. Deve haver morte tal como existir o erro (não o pecado alimentado pela santa igreja), viver é a minha religião. Eu sei que esta mortal casa de barro se irá um dia dissolver e acabar por desaparecer. Digo eu, assim vivo, luto pelo que acredito, o que sinto por quem amo é a minha graça terrestre: conquisto assim ...
Comentários
A cortina move-se, ele afasta-se. A silhueta da mulher perfila-se na janela. Abre-a, cá fora telhados escuros, ao longe, o encadeado das varandas e das mansardas dos antigos edifícios, o céu azul límpido, embora não se saiba dizer se é o cair da noite ou a manhã. A mulher vira-se, o seu corpo e o seu rosto estão difusos, só os olhos brilham intensamente, como os olhos de gato na escuridão.
[Gao Xingjian in, A Montanha da Alma]
És tu. E eu contigo.
Tudo, cada vez mais.
e tremem no abrir-se a dentes línguas
tão penetrantes quanto línguas podem.
Mais beijo é mais. É boca aberta hiante
para de encher-se ao que se mova nela.
É dentes se apertando delicados.
É língua que na boca se agitando
irá de um corpo inteiro descobrir o gosto
e sobretudo o que se oculta em sombras
e nos recantos em cabelos vive.
É beijo tudo o que de lábios seja
quanto de lábios se deseja.
[Jorge de Sena]
Inteiros.
Tudo, cada vez mais.