Um artísta português I



Em cima do seu sofá ao crepúsculo, com um olhar irrequieto, um artista perante as cores pálidas do céu lisboeta. A luz difusa, suave e persistente é desperdiçada. Esvai-se.
Estranhamente manso, aqueles olhos escuros pareciam derreter os céus.

Sobre ele passa uma humidade súbita, como neblina sobre uma estrela. Ele baixa a cabeça e pressiona-a contra a palma da mão, como que para esmagar o pensamento.

Comentários

Maria disse…
Retendo a respiração, encostou-se à parede e esperou. Agora, ela vinha vindo, como se esperasse que ele estivesse pendurado. A mão dela encontrou-lhe o ombro, que apalpou cravando-lhe as unhas. E logo o outro braço lhe rodeou a cabeça, puxando-lha para os lábios entreabertos. Toda ela se lhe colou violentamente, esfregando-se contra ele. E, sentindo-se sorvido por beijos calcados e intermitentes, ouviu que ela lhe dizia rouca: «Assim, assim, quero-te... Vem.» E ele, cujo corpo era todo uma tensão que estourava, segurando o gorro para que lhe não caísse, deixou-se despir por aquelas mãos que todo o percorriam, sem deixarem recanto que não perscrutassem com dedos interrogativos...

[Jorge de Sena in, O Físico Prodigioso]

E ela agarra-o.
Tudo,
Unknown disse…
Com lento amor olhava os dispersos
Tons da tarde. A ela comprazia
Perder-se na complexa melodia
Ou na curiosa vida dos versos.
Não o rubro elemental mas os cinzentos
Fiaram seu destino delicado,
Feito a discriminar e exercitado
Na vacilação e nos matizes.
Sem se atrever a andar neste perplexo
Labirinto, olhava lá de fora
As formas, o tumulto e a carreira,
Como aquela outra dama do espelho.
Deuses que habitam para lá do rogo
Abandonaram-na a esse tigre, o Fogo.

[J.L.Borges]

E ele agarra-a.
Este fogo,

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