Um artísta português I
Em cima do seu sofá ao crepúsculo, com um olhar irrequieto, um artista perante as cores pálidas do céu lisboeta. A luz difusa, suave e persistente é desperdiçada. Esvai-se.
Estranhamente manso, aqueles olhos escuros pareciam derreter os céus.
Sobre ele passa uma humidade súbita, como neblina sobre uma estrela. Ele baixa a cabeça e pressiona-a contra a palma da mão, como que para esmagar o pensamento.
Comentários
[Jorge de Sena in, O Físico Prodigioso]
E ela agarra-o.
Tudo,
Tons da tarde. A ela comprazia
Perder-se na complexa melodia
Ou na curiosa vida dos versos.
Não o rubro elemental mas os cinzentos
Fiaram seu destino delicado,
Feito a discriminar e exercitado
Na vacilação e nos matizes.
Sem se atrever a andar neste perplexo
Labirinto, olhava lá de fora
As formas, o tumulto e a carreira,
Como aquela outra dama do espelho.
Deuses que habitam para lá do rogo
Abandonaram-na a esse tigre, o Fogo.
[J.L.Borges]
E ele agarra-a.
Este fogo,