Carta ao meu avô
Escrevo para ti desta vez para dizer-te as coisas
que a boca de uma criança não consegue dizer. Escrevo-te para libertar o que
sinto, escrevo-te enquanto a dor te invade e uma outra faz tremer o chão que
piso ameaçando engolir-me.
Escrevo-te para que possas imaginar este neto
perante ti, pensar como cresceu mais rápido que o tempo e nas vezes que
estiveste presente a vê-lo crescer. Escrevo-te em esperança de outros tantos
abraços, de voltar a sentir os teus braços dobrar-se perfeitamente sobre mim,
de estarmos juntos noutro local (onde devíamos estar e não aqui).Escrevo-te na possibilidade de me escreveres também e iniciar assim uma correspondência de duração indeterminada. Escrevo-te desta minha parte que te adora, deste meu todo.
Comentários
Foi um choque
seguido de um cometa que deixa atrás de si uma cauda imensa e cintilante.
Obriga a que nos recolhamos."
Tomas Tranströmer
Abraço-te longamente e assim fico ao teu lado.
Sempre,
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação."
[C.D.de Andrade]
O mundo ficou mais pobre com a tua ausência, avozinho.