A sua recusa



Se é amor, a respiração cansada de pintar inundações até à costa, o olhar descaído ainda a ler sobre a terra os tristes memoriais de amores deseperados; se é amor, lutar contra nós mesmos, deitar e chorar, erguer o pesar, a pedra que nunca descansa, ainda a reclamar arrependimentos apesar de nenhum alívio; se é amor, vestir-me de pensamentos negros, assombrar caminhos inexplorados para chorar longe; o prazer do horror, música de notas trágicas, lágrimas nos olhos e arrependimento no peito.

Viver uma morte viva, então para quê respirar? Se isto é amor? Não, é a sua recusa.

Comentários

Maria disse…
"Uma palavra. Disse-a. Amo-te - uma palavra breve. Quantos milhões de palavras eu disse durante a vida. E ouvi. E pensei. Tudo se desfez. Palavras sem inteira significação em si... Palavras que remetiam umas para as outras e se encostavam umas às outras para se aguentarem na sua rede aérea de sons. Mas houve uma palavra... Uma palavra que eu disse e repercutiu em ti, palavra cheia, quente de sangue, palavra vinda das vísceras, da minha vida inteira, do universo que nela se conglomerava, palavra total. Todas as outras palavras estavam a mais e dispensavam-se e eram uma articulação ridícula de sons e mobilizavam apenas a parte mecânica de mim, a parte frágil e vã. Palavra absoluta no entendimento profundo do meu olhar no teu, palavra infinita como o verbo divino.

Uma palavra. Recupero-a agora... Amo-te. Na intimidade exclusiva e ciumenta do nosso olhar mútuo e encantado. Fecha-nos o lençol na claridade difusa do amanhecer, estás perto de mim no intocável da tua doçura.

Uma palavra. A primeira que em toda a minha vida me esgotou o ser. A que foi tão completa e absorvente, que tudo o mais foi um excesso na criação. Deus esgotou em mim, na minha boca, todo o prodígio do seu poder. Ao princípio era a palavra. Eu a soube. E nada mais houve depois dela."

Vergílio Ferreira in, Para Sempre

Contigo.
Amo-te,
Unknown disse…
Nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

[Pablo Neruda]

E nunca a palavra, porque por ela vivo.
Amo-te,

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